LC 173 | Reposição inflacionária do funcionalismo é SIM permitida. Entenda o caso!
Com o advento da pandemia do novo Coronavírus, o Governo Federal implantou a Lei Complementar (LC) 173, de 27 de maio de 2020 com o intuito de ajudar Estados e municípios no enfretamento da Covid-19. Em suma, a oferta financeira estabeleceu algumas regras como “acordo” para a União liberar recursos aos governadores e prefeitos. E uma disposição polêmica e com controvérsias foi a de “não conceder, a qualquer título, vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública”.
A lei se estende até 31 de dezembro de 2021. Portanto, à primeira vista, concluísse que está vedado qualquer aumento salarial dos Servidores. Mas é preciso fazer uma análise mais profunda. A começar pelo art. 37, inciso XV, da Constituição Federal, o qual proíbe a redução dos subsídios ou vencimentos, ou seja, não se pode falar em reajuste para menor.
PROCESSO NO PARANÁ
Em parecer da assessoria jurídica do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), em resposta ao prefeito de Campo Bonito/PR, Antônio Carlos Dominiak (gestão 2017-2020), afirmou que a revisão geral anual de vencimentos não é vedada pela LC 173 e que também as gratificações por tempo de serviço já implementadas até 27 de maio de 2020 devem ser pagas.
A explicação da Diretoria Jurídica do TCE-PR é que o reajuste salarial é destinado particularmente às reconfigurações ou às revalorizações de carreiras específicas, por meio de reestruturações de tabela remuneratórias, por exemplo. Em outras palavras, a reposição inflacionária dos Servidores, ainda que represente na prática aumento do valor de salário, não é vedada pela LC 173 por se tratar de manutenção do poder aquisitivo do trabalhador.
Além disso, aplica-se também para casos de progressões estabelecidas em Planos de Cargos, Carreiras e Salários, tais como anuênios e quinquênios, ou quaisquer outras gratificações concedidas antes do estado de calamidade pública e que já estejam aplicadas juridicamente (“exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública”).
O Ministério Público de Contas (MPC-PR) destacou que a concessão de revisão geral anual para a recomposição inflacionária da remuneração dos Servidores públicos não é vedada pelo artigo 8º, I, da LC 173/20, desde que observadas as exigências legais, orçamentárias e constitucionais aplicáveis à espécie.
CONSTITUIÇÃO
- O inciso IV do artigo 7º da CF/88 dispõe que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais o salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer um.
- O inciso X do artigo 37 da CF/88 fica que a remuneração dos servidores públicos e o subsídio dos agentes políticos somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices.
DECISÃO
O relator do processo, conselheiro Artagão de Mattos Leão, afirmou que o texto do inciso I do artigo 8º da LC 173/20 não proíbe a concessão de revisão geral anual. Ele destacou que não se pode confundir revisão, que diz respeito à concessão de aumento real da remuneração para garantir o equilíbrio da condição financeira do Servidor, com reajuste.
Artagão lembrou que a revisão geral anual, prevista no artigo 37, X, da Constituição Federal, não gera ganho remuneratório real, mas apenas promove a recomposição da perda inflacionária frente à instabilidade da moeda. Ele acrescentou que o artigo 8º, I, da LC 173/20 não veda a recomposição inflacionária; mas, na verdade, impede eventual aumento real concedido aos servidores, tanto que o seu texto veda expressamente o reajuste acima da variação da inflação e prevê a preservação do poder aquisitivo.
OPINIÃO
Em uma análise sobre a LC 173, o advogado Dr. Antonio Nestor Cunha de Sá, graduado pela Universidade Federal do Piauí-UFPI, pós-graduando em Licitações e Contratos e com atuação em direito administrativo, sindical, trabalhista e previdenciário, afirma:
Desse modo, em que pese as vedações trazidas pela Lei Complementar 173/20, não merece prosperar a tese de que o aumento salarial estaria vedado em absoluto. Há exceções claras à regra que devem ser observadas de modo a garantir o cumprimento dos planos de cargos, carreiras e vencimentos dos servidores públicos”.
PARECER DO CONSELHO NACIONAL DE MUNICÍPIOS (CNM)
No mês de março o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou constitucional toda a Lei Complementar 173/2020. O veredito veio de encontro a três ações diretas de inconstitucionalidade (ADI), abertas por PT, PDT e Podemos, todas relatadas pelo ministro Alexandre de Moraes. Em fevereiro, o CNM divulgou parecer aos municípios e, em seu posicionamento, fica claro o entendimento de exceções na vedação de reajustes, como em casos de salário-base inferior ao salário mínimo e progressões implantadas antes de vigorar a LC 173. Apesar disso, o parecer afirma que, segundo a LC 173, o reajuste recai na recomposição da remuneração dos Servidores, caracterizando-se como uma adequação de remuneração, que é vedada pela Lei Complementar na forma da expressão “qualquer título”.
No entanto, como explicou o TCE-PR no processo citado nesta matéria, é vedado aos entes criar despesa obrigatória de caráter continuado; adotar medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida na Constituição Federal. Sendo assim, a reposição inflacionária não é impedida pela LC 173.