O debate público sob as “guerras” de narrativas e cultural | Artigo de Marcos Verlaine
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A extrema-direita mundial tem se valido, em larga escala, das chamadas “guerras de narrativas” e também da “guerra cultural” para influenciar o debate público, a fim de disputar corações e mentes, com propósito de avançar sobre o poder político para imprimir sua visão de mundo.
Essas guerras eclodiram no Brasil, mais evidente no período pós-redemocratização, em 2013, naquelas jornadas de junho e julho, cujo início se deu nas manifestações contra o aumento das passagens de ônibus, em São Paulo. Naquela ocasião, o prefeito era ninguém mais, ninguém menos, que Fernando Haddad (PT), o atual ministro da Fazenda.
De lá para cá, o debate público ganhou rumos e contornos inimagináveis, a extrema-direita, que era insignificante, cresceu exponencialmente, e até um “filhote da ditadura” foi eleito presidente da República, 2 gerações depois do fim do regime de exceção.
E mesmo depois da derrota de Bolsonaro, em 2022, a direita segue caudalosa e, portanto, ameaçadora. Por que o chamado bolsonarismo não arrefeceu? Porque, talvez, tenha chegado para ficar.
É preciso, então, entender sobre essas “guerras”, a fim de combatê-las com eficácia. Vamos então tentar entendê-las.
➡️ GUERRA DE NARRATIVAS
A guerra de narrativas refere-se ao conflito entre diferentes versões ou visões da mesma história, em que grupos ou indivíduos tentam influenciar a percepção pública sobre eventos, ideias ou políticas.
Essa prática se torna evidente em debates sobre política, economia e cultura, em que diferentes atores sociais buscam moldar a opinião pública a seu favor.”
E, assim, a “narrativa” que prevalece pode impactar decisões políticas, mobilizações sociais e até mesmo a economia, tornando esse conceito crucial para entender a dinâmica da informação na sociedade contemporânea, sob plataformas digitais e permanentemente on-line.
➡️ PAPEL DAS REDES NESSAS GUERRAS
As chamadas mídias sociais desempenham papel fundamental na guerra de narrativas, pois permitem que informações sejam disseminadas rapidamente, sem mediações, e alcancem grande número de pessoas instantaneamente e ao mesmo tempo.
Essa “democratização” da informação, embora positiva em muitos aspectos, também pode levar à desinformação e à polarização, vez que as pessoas tendem a seguir e compartilhar conteúdos, sem nenhuma ou pouca informação, pelo fato de que confirmam as crenças pré-existentes, com as quais concordam.
➡️ GUERRA CULTURAL
O termo tem significados diferentes, dependendo do tempo e lugar onde é usado, e como se relaciona com os conflitos pertinentes à determinada área e época. Originalmente, refere-se ao conflito entre tradicionalistas, liberais clássicos ou valores conservadores, e democracia social, progressista ou valores sociais liberais no mundo Ocidental.
Guerras culturais têm influenciado o debate sobre a história, a ciência e outros programas e em todas as sociedades ao redor do mundo. Essa guerra sempre existiu, a partir do advento do capitalismo, em particular depois da Revolução Russa, em 1917, quando 2 visões de mundo entraram em conflito — socialismo e capitalismo —, em particular depois da 2ª Grande Guerra, quando teve início a Guerra Fria.
No Brasil, essa guerra ganhou contornos de relevância e radicalização, após a redemocratização (1985), a partir da primeira eleição de Lula, em 2002. E consolidou-se, a partir da eleição de Bolsonaro (2018).
➡️ BASE IDEOLÓGICA DA GUERRA CULTURAL
A base ideológica da guerra cultural empreendida pela extrema-direita é o chamado “marxismo cultural”, que se trata, pois, de teoria da conspiração antissemita — preconceito ou ódio contra os judeus — extremista, que reivindica o marxismo ocidental como a base de alegados esforços acadêmicos e intelectuais contínuos para subverter a cultura ocidental.
Assim alega que elite de teóricos marxistas e intelectuais da Escola de Frankfurt estão a subverter a sociedade ocidental, por meio de guerra cultural, que mina os valores cristãos do conservadorismo tradicionalista e promove os valores culturais do multiculturalismo e contracultura da década de 1960, política progressista e politicamente correta, falseada como política identitária criada pela teoria crítica.”
Por aqui embasam tentativas de reescrever a história, tais como dizer que a escravidão foi benéfica para o povo negro, que não houve ditadura militar ou que foi boa para o Brasil, que na ditadura não havia corrupção ou que foi dura apenas contra os “bandidos”. Evidentemente, que se trata é cipoal de bobagens, mas que ganha expressão por meio das redes digitais.
É um verdadeiro “samba do crioulo doido”, que necessita combate enérgico e inteligente. Do contrário prevalece como verdade ou ponto de vista verdadeiro, dependendo da vista do ponto.
Marcos Verlaine é Jornalista, analista
político e assessor parlamentar do Diap
(Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar).