País assiste ao avanço de incêndios generalizados enquanto governo segue sem ações efetivas
O Brasil está em chamas, e isso não é uma figura de linguagem. Os principais biomas do país estão literalmente sendo consumidos por queimadas e incêndios generalizados sem precedentes, resultado de uma mistura explosiva de secas severas e absoluto descaso proposital do poder público com a proteção do meio ambiente. Mas até que ponto essas tragédias poderiam ser evitadas ou combatidas?
A destruição ambiental não respeita fronteiras, nem biomas, e o Brasil enfrenta hoje uma das piores crises ambientais de sua história, com consequências potencialmente danosas para toda a sociedade.
No Pantanal, maior planície interior inundada do mundo, o fogo já atingiu, até o final de agosto, mais de 12 % do bioma. No Cerrado, a savana mais biodiversa do mundo, já foram registrados mais de 38 mil focos de calor até hoje (16) e, na Amazônia, os números de queimadas e incêndios florestais registrados até o dia 14 deste mês já superaram setembro inteiro de 2019, um crescimento de 86% para o período, na comparação com o mesmo período do ano passado.
A gravidade da situação é resultado, sobretudo, do projeto de destruição conduzido pelo governo Bolsonaro. O projeto do governo é o desmonte sistemático das estruturas e políticas públicas que promovem a proteção ambiental, somada a ausência premeditada de plano, meta ou orçamento capazes de proteger as riquezas naturais do Brasil de forma concreta. Este ano, por exemplo, mesmo com a crise provocada pelas queimadas generalizadas, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) só gastou 0,4% dos recursos para ações diretas e já prevê cortes no orçamento para 2021.
BRASIL QUEIMA, O MUNDO PERDE
As mudanças climáticas geram uma série de impactos em nossas vidas. Projeções apontam consequências como aumento de temperatura, redução de chuvas e consequentemente períodos mais secos em algumas regiões, incluindo a América do Sul. Essa é a previsão da Organização Mundial de Meteorologia para o período de 2020-2024.
Um clima mais seco, por sua vez, é mais propício à ocorrência e propagação do fogo. A combinação de um clima mais seco à outros fatores, como a disponibilidade de material combustível (madeira, folhas, restos do desmatamento) e a fontes de ignição (onde entra a utilização de fogo para limpeza de área agrícola ou em processos de desmatamento) aumenta drasticamente as chances de ocorrência de incêndios. Todos os processo citados acima tem influência da ação humana.
Nos anos 2000 cientistas nomearam a era geológica atual da terra de “Antropoceno”, no qual as ações humanas mudam as características do planeta, principalmente devido ao aumento vertiginoso das emissões de gases do efeito estufa. Mais recentemente, o professor e historiador ambiental Stephen Pyne sugeriu que estamos entrando uma nova era, a do fogo ou Piroceno, que pode remodelar nosso planeta da mesma forma que a última Era do Gelo esculpiu nossos rios e lagos. Os impactos seriam devastadores para o clima e para a biodiversidade.
O processo pode levar à extinção em massa, mudança no nível dos oceanos e mudanças radicais na vegetação. De fato, o planeta está em chamas: Amazônia, Cerrado, Pantanal, Califórnia, Austrália, Rússia e Indonésia.
Essas queimadas operam em um círculo vicioso: quanto mais queima, mais seco fica o clima local fazendo que a vegetação queime mais. Ao queimar a vegetação, são liberados gases do efeito estufa na atmosfera, potencializando as mudanças climáticas, que por sua vez causam aumento de temperatura e clima mais seco em diversas regiões do mundo.
O fogo e as mudanças climáticas alteram os ecossistemas de maneira que a biodiversidade, muitas vezes, não consegue se adaptar. Como isso nos afeta? uma biodiversidade em equilíbrio mantém a natureza saudável, questão fundamental para evitar a ocorrência de doenças e pandemias. Além disso, a fumaça das queimadas já chegaram à diversas cidades como Cuiabá, Manaus e Rio Branco, e podem aumentar ainda mais o risco de doenças respiratórias, em um momento em que ainda enfrentamos a crise do Covid-19.
O Pantanal
Apesar de ocorrerem no bioma, as queimadas no Pantanal não são fenômenos naturais, têm origem criminosa, como na Amazônia. Mesmo com decreto que proíbe o uso do fogo nesses dois biomas desde meados de julho, as queimadas seguem fora de controle.
No Pantanal, a intensidade observada este ano é inédita e, segundo matéria publicada pelo site Ecoa, informações do PrevFogo (Ibama) apontam que 98% das queimadas no bioma são oriundas de ações humanas, especialmente para limpeza de pastagens, de material de desmatamento e estradas. O agronegócio tem se expandido na região com o aumento da plantação de grãos, de pastagens exóticas e desmatamento – modelo que intensifica as mudanças climáticas e agrava a crise da biodiversidade.
A sucessão de anos com poucas chuvas, vento seco e a baixa umidade do ar na Bacia do Alto Paraguai, onde fica o Pantanal, foram fatores determinantes para a propagação dos incêndios deste ano. Os grandes rios do Pantanal receberam pouca água entre 2019 e 2020, o que reduziu suas áreas de inundação, deixando mais espaço para desmatamento, queimadas e propagação de incêndios.
Diversos fatores, separados ou combinados, podem estar relacionados à seca severa que ocorre no Pantanal, incluindo processos climáticos, meteorológicos, mudanças no uso da terra na região, mudança na temperatura de oceanos, mudanças climáticas e até o desmatamento na Amazônia e Cerrado.
Os biomas estão interligados, enquanto o Cerrado é conhecido como a caixa d’água do Brasil por concentrar as nascentes de muitos rios e bacias hidrográficas, a Amazônia produz uma série de serviços ambientais distribuídos pelo país, um deles é levar chuvas para regiões distantes. Os chamados “rios voadores” podem ser enfraquecidos devido ao desmatamento e, consequentemente, levar menos umidade para as outras regiões, incluindo o Pantanal.
Como resultado, há um número recorde de números de focos de incêndio no Pantanal este ano, com mais de 15 mil focos até o momento, este acumulado já é o maior da série histórica anual desde que as medições começaram, em 1998. Com apenas metade do mês de setembro, os focos já superam em 84% os focos registrados para setembro inteiro em 2019.
Segundo o MapBiomas, entre 1985 e 2019, 12% da área original do bioma foi perdida, porcentagem que deve aumentar significativamente após os incêndios de 2020. De acordo com a Fundación Amigos de la Naturaleza, A área afetada por incêndios florestais em todo o Pantanal até julho de 2020 cobria cerca de 768 mil hectares. Na Bolívia, 147 mil (19%) ha foram queimados, no Paraguai 86 mil ha (11%) e no Brasil 534 mil ha (70%).
O Pantanal é um hotspot de biodiversidade e possui a maior concentração de vida selvagem do continente. Uma população expressiva de onças pintadas vive ali, o bioma também hospeda um dos maiores santuários de araras-azuis. No momento, essas e outras espécies estão drasticamente ameaçadas pelo fogo. Além das espécies, o fogo também prejudica elementos da economia local, como o ecoturismo e a pecuária pantaneira.
O FUTURO QUE QUEREMOS
É dever do governo federal zelar pelo patrimônio ambiental dos brasileiros. Nossos biomas são motivo de orgulho e parte da nossa identidade. O governo federal deveria tratar com seriedade os graves incêndios e queimadas que ocorrem de forma descontrolada no Pantanal e nos outros biomas, causando danos irreversíveis. No entanto o que tem feito é negar ou minimizar o problema. As ações implementadas até o momento – incluindo a moratória do fogo e combate ao desmatamento e queimadas executado pelas forças armadas – já se mostraram ineficazes e insuficientes.
Quem perde com essa combinação entre desgovernança e clima seco é a população. Além dos impactos na saúde das pessoas e no equilíbrio da natureza, a imagem do Brasil fica ainda mais queimada nas relações comerciais e diplomáticas. Embora investidores, mercados e governos lá fora estejam de olho e já tenham sinalizando que podem romper acordos comerciais e boicotar produtos brasileiros por conta desta política antiambiental, o governo Bolsonaro segue firme em seu propósito de destruir o Brasil, enquanto usa táticas de desinformação e repressão para esconder a verdade.
Fonte: Greenpeace