Artigo | Impacto das novas tecnologias nas relações de trabalho e no sindicalismo
Muitas dessas transformações no mundo do trabalho já estavam em curso antes da pandemia. A Covid-19 só fez acelerar o processo. E a tendência é que essas ganhem mais celeridade no próximo período, até como forma de o capitalismo enfrentar a sua crise prolongada e sistêmica.
Inteligência Artificial (IA), Banco de Dados (Big Date), 5G (internet de quinta geração), entre outras mudanças tecnológicas, terão ainda maior impacto no mundo do trabalho, em todos os ramos de atividade. Se a automação microeletrônica afetou principalmente a indústria e os bancos, estas novas mudanças atingirão em cheio o setor público, o campo e o ramo de serviços e do comércio.
Como aponta o sociólogo Clemente Ganz Lúcio, ex-diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), essas múltiplas e profundas mutações produzirão “intensos impactos sobre os empregos e as formas de ocupação laboral; sobre a quantidade, os tipos e os conteúdos dos postos de trabalho; sobre as profissões, seus conteúdos e a pertinência da sua existência; sobre os conteúdos, métodos e atualização da educação e formação profissional; sobre as habilidades necessárias para trabalhar nos novos contextos; sobre as formas de contratação e de inserção laboral, que passam pelo assalariamento clássico, às várias formas de trabalho autônomo e por conta própria, ao contrato intermitente, por prazo determinado ou eventual, aos vínculos mediados por plataformas e aplicativos, a pejotização, uberização, entre outros”.
“As transformações sempre existiram porque fazem parte da essência da vida em todas as suas dimensões, inclusive na econômica, como revelam as três revoluções industriais no último século e meio. Na atualidade histórica está em curso o processo da 4ª revolução tecnológica, com impactos em todo o sistema produtivo, ao mesmo tempo que ocorrem profundas mudanças culturais cujas extensões são múltiplas e totalizantes.”
A profundidade dessas mudanças tem caráter disruptivo, abandonando rapidamente o velho mundo, que vai perdendo predominância e hegemonia. O novo mundo emerge com a velocidade acelerada e efeitos que se distribuem em todas as direções” (publicado no site Poder 360, em 5/7/21).
O GOLPE DO CAPITAL CONTRA O TRABALHO
Em decorrência das mutações tecnológicas sob o comando e a lógica do capital, as classes dominantes promovem ajustes legais para elevar ainda mais seus lucros. O neoliberalismo imposto a partir dos anos 1990, após o fim do chamado bloco soviético e a crise do socialismo, agora se transformou no ultraneoliberalismo, ainda mais perverso e desumano.
O mundo do trabalho está sendo totalmente devastado, com a explosão do desemprego, da informalidade, da precarização. Direitos históricos consagrados nas leis são destruídos na maioria dos países.
As “reformas trabalhistas” — na verdade, deformas — atingem várias nações com o “objetivo de reduzir o custo do trabalho; criar a máxima flexibilidade de alocação da mão de obra, com as mais diversas formas de contrato e ajustes da jornada; reduzir ao máximo a rigidez para demitir e minimizar os custos de demissão, sem acumular passivos trabalhistas; restringir ao limite mínimo as negociações e inibir contratos ou convenções gerais em detrimento de acordos locais realizados com representações laborais controladas; além de quebrar os sindicatos” — explica Clemente Ganz Lúcio.
Estudo recente da OIT (Organização Internacional do Trabalho) aponta que, após a grave crise econômica mundial deflagrada em 2008, mais de 110 países promoveram algum tipo de ataque à legislação laboral. Ao todo, foram 642 mudanças, sendo que 55% dessas visaram diminuir a proteção ao emprego.
É nesse contexto mundial de retrocessos que ocorre no Brasil, em 2016, o impeachment criminoso da presidenta Dilma Rousseff. Como aponta o jornalista Umberto Martins, no indispensável livro “O golpe do capital contra o trabalho”, um dos principais objetivos dessa trama da cloaca burguesa no país foi facilitar o caminho da “deforma” trabalhista — uma das primeiras medidas do traíra golpista Michel Temer.
OS ESTRAGOS DA “DEFORMA TRABALHISTA”
Um balanço feito pela revista Fórum nos quatro anos da entrada em vigor dessa reforma, completados em 11 de novembro passado, mostra o desastre causado aos assalariados brasileiros e explica como tanta gente foi ludibriada com a propaganda dos golpistas e da sua mídia venal.
“Muito longe da promessa de milhões de empregos anunciada pelo governo de Michel Temer, o saldo foi um alto índice de desemprego e o desmonte dos direitos dos trabalhadores. Na época, Temer chegou a alardear que o pacote de medidas criaria 2 milhões de vagas em 2 anos, e 6 milhões em 10 anos”.
Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que, ao contrário disso, o desemprego disparou. No trimestre terminado em julho de 2021, a taxa de desocupação ficou em 13,7%. Esse número é quase 2 pontos percentuais a mais que os 11,8% registrados no último trimestre de 2017. No período, o total de desempregados subiu de 12,3 milhões para 14,1 milhões.
Outra das promessas de Temer que falhou foi a propalada diminuição da informalidade. No trimestre encerrado em outubro de 2017, antes das novas regras, a taxa de informalidade era de 40,5%, de acordo com o IBGE. O instituto aponta que, entre maio e julho de 2021, a proporção de pessoas ocupadas trabalhando na informalidade ficou em 40,8%”.
Mas a cloaca burguesa ainda não está satisfeita. Ambiciosa, quer mais sangue, quer “passar a boiada”. Não é para menos que apoiou e financiou a eleição de Jair Bolsonaro (PL). O atual presidente nunca escondeu que é um fascista a serviço do capital, um “laranja” da burguesia.
Com sua retórica belicista, ele vive atacando a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), a fiscalização trabalhista, a restrição ao trabalho dos menores de idade. Ele até tentou impor uma “minirreforma trabalhista”, que golpearia ainda mais os direitos dos assalariados — principalmente dos mais jovens, que teriam inúmeros tipos de contratação sem direitos.
A regressão foi aprovada na Câmara Federal em 2020, mas foi derrotada pelo Senado em setembro de 2021 graças à pressão unitária do sindicalismo em conjunto com as bancadas progressistas no parlamento.
Altamiro Borges é Jornalista e presidente do Centro
de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.