Videogames | 5 pontos para entender que ele não mata e traz benefícios
Sem dúvida, a indústria de videogames já é uma potência mundial. Nos últimos anos o crescimento deste mercado é absurdo e move milhões por ano. Contudo, se você não teve muita interação com eles, ver alguém jogar pode ser uma experiência bastante perturbadora. Os jogadores muitas vezes dão a impressão de estarem colados à tela e de não se importar com o resto do mundo. Mas, analisando profundamente, a história é outra. Aqui vão 5 pontos para entender:
1. “Os videogames nos tornam mais violentos”
Um dos mais antigos slogans sobre os videogames é fazer os jogadores ficarem mais agressivos no mundo real. É uma preocupação que se torna agudamente visível no contexto das chacinas a tiros. Os videogames geralmente ocupam o centro do palco nas análises feitas pela mídia dessas atrocidades, com insinuações de que não só os perpetradores praticam jogos violentos como foram levados a cometer o ato porque jogavam.
Essas acusações muitas vezes perdem força depois de uma análise forense. Na verdade, evidências científicas sugerem que a ligação entre games e agressão é fraca. Em um estudo recente publicado em Molecular Psychiatry, os participantes foram solicitados a praticar um jogo violento (Grand Theft Auto V), um não violento (The Sims 3) ou nenhum jogo, todos os dias durante dois meses. Usando uma série de questionários e medições comportamentais para testar a agressividade, atitudes sexistas e questões de saúde mental, os autores do estudo descobriram que jogar o game violento não tinha efeitos negativos significativos sobre qualquer uma das medidas.
De modo semelhante, pesquisa publicada neste ano em Royal Society Open Science mostrou que, em um estudo com mais de 2 mil adolescentes e cuidadores no Reino Unido, não havia evidência de que praticar jogos violentos deixasse os jovens mais agressivos ou menos sociáveis.
Dois estudos não vão nos dar a história inteira, é claro, mas a imagem que surge da literatura de pesquisa é que os videogames não parecem ter um impacto significativo sobre o comportamento agressivo e que, certamente, não são a causa principal de atos de violência em massa.
2. “Os videogames causam vício”
No verão de 2018, a Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu formalmente “transtorno de jogo” em seu manual de diagnósticos, a Classificação Internacional de Doenças. A decisão desencadeou uma discussão furiosa na comunidade acadêmica. Um grupo de estudiosos afirmou que esse rótulo oferecerá maior acesso a tratamento e ajuda financeira aos que experimentam verdadeiros problemas por jogar videogames. Outros (inclusive eu mesmo) afirmaram que a decisão era prematura; que a evidência científica da dependência dos jogos simplesmente não era acurada ou significativa (ainda).
Parte do problema está nas listas de checagem usadas para determinar se um transtorno existe. Historicamente, os critérios para dependência de jogos foram derivados dos usados para outros tipos de dependência. Embora esse possa ser um lugar razoável para se começar, talvez não conte toda a história sobre quais são os aspectos únicos do vício em videogames. Por exemplo, um dos critérios-padrão é que as pessoas ficam preocupadas com jogos, ou começam a jogá-los exclusivamente, em vez de praticar outros hobbies. Porém, estes não se encaixam bem como parâmetro do que se poderia considerar envolvimento “prejudicial”, porque os jogos em si (ao contrário do abuso de drogas, por exemplo) não são inerentemente nocivos.
Usar esse critério também tem o potencial de inflar a predominância da dependência. Embora haja pessoas por aí para quem o jogo pode se tornar um problema, é provável que seja um pequeno grupo.
Além disso, algumas pesquisas sugerem que a dependência de jogos é razoavelmente passageira. Dados que examinam jogadores num período de seis meses mostraram que, dos que exibiam inicialmente o critério de diagnóstico de dependência, nenhum chegou ao limite no final do estudo.
Isso não quer dizer que não haja nada com que se preocupar nos jogos. Cada vez mais, e especialmente no caso de jogos para celular, mecanismos de aposta na forma de compras por aplicativo e “caixas de recompensas” estão sendo usados como fontes de renda. Aqui, algumas pesquisas emergentes sugerem uma correlação entre pessoas que gastam dinheiro comprando recompensas para adquirir novos itens do jogo e notas sobre medidas de jogo problemático. Esse trabalho é preliminar, e ainda não sabemos a direção casual da relação, mas ela indica que há alguns aspectos do marketing e monetização dos games com que devemos tomar cuidado.
3.“Games causam isolamento social”
A visão estereotipada de um jogador é um adolescente branco pálido jogando sozinho em seu quarto. É compreensível que algo nessa situação parece insalubre ou não natural. Mas essa opinião geralmente vem da incompreensão do que realmente são os videogames. Desde a sua concepção, os jogos foram projetados como experiências sociais. Enquanto nos primeiros 30 anos de sua existência isso se restringiu a pessoas praticando jogos de diversos jogadores umas com as outras, o advento do acesso à internet em alta velocidade significa cada vez mais que essas interações estão se movendo para a rede. Em vez de isolar as pessoas, os jogos online têm o potencial de nos aproximar de diversas novas maneiras, de formar comunidades sólidas em torno de interesses e passatempos comuns.
Mats Steen, por exemplo, nasceu com distrofia muscular de Duchenne, uma doença devastadora que causa a deterioração progressiva dos músculos. Conforme ele cresceu, para o mundo exterior – mesmo para sua família –, ele parecia se tornar isolado e retraído. Depois que ele morreu, em 2014, com 25 anos, surgiu uma imagem diferente – Mats tinha uma vida plena e feliz no mundo online de Azeroth, o cenário do antigo jogo World of Warcraft. Longe de estar sozinho, Mats estava cercado de amigos nesse mundo, que se uniram para viajar à Noruega para o enterro dele.
Para Mats, como para muitas outras pessoas em todo o mundo, o valor de jogar videogames não está apenas em sua capacidade de ajudá-lo a escapar, mas em sua capacidade de ajudar a nos conectarmos com outras pessoas.
4. “É uma perda de tempo sem sentido”
Muitas vezes ouço essa crítica como pesquisador de games – não poderia estar fazendo algo melhor com meu tempo? Há uma certa dissonância na ideia: de alguma forma, somos capazes de ao mesmo tempo nos preocuparmos com que os jogos sejam a raiz de muitos problemas sociais, mas também considerarmos que eles sejam algo inútil ou vazio de se fazer. Por que jogar, quando você poderia ir lá fora ou se envolver em formas de arte mais enriquecedoras culturalmente? Mas isso vem de uma incompreensão sobre o poder criativo dos games. Eles nos oferecem uma oportunidade de experimentar o nosso mundo e outros lugares fantásticos de uma maneira que nenhuma outra forma de mídia consegue chegar perto.
Como explicou a romancista e designer de games Naomi Alderman em um ensaio por rádio em 2013: “Enquanto todas as formas de arte podem instigar emoções poderosas, só os videogames conseguem fazer seu público sentir a emoção da agência. Um romance pode entristecê-lo, mas só um game pode fazê-lo se sentir culpado por seus atos”.
Os videogames o colocam no centro da história – você é um participante ativo, e não um observador passivo. Eles nos oferecem um lugar seguro para interrogar e testar as consequências emocionais de nossos atos. Longe de ser um desperdício de tempo, então, os games nos ajudam a explorar o que significa ser humano. explorar ideias de amor e perda e a viajar para lugares distantes e incríveis, a nos tornarmos pessoas também incríveis – tudo isso no conforto de nossas casas.
5. “É meramente diversão”
Os videogames, obviamente, foram um produto do desenvolvimento científico. Cada vez mais essa relação se torna simbiótica – em parte por seu poder de nos absorver, os videogames estão sendo aproveitados em estudos científicos. Os melhores exemplos disso realizam duas coisas: eles agem como terreno fértil para coletar dados científicos, e ao mesmo tempo são uma experiência divertida.
Por exemplo, o recente game para celular Sea Hero Quest. Desenvolvido em 2016, ele é um laboratório virtual vivo e respirante, onde os jogos atuam como um experimento. Os jogadores devem memorizar um mapa e depois navegar num barco por uma série de vias aquáticas, visitando um conjunto de boias em uma determinada ordem. Esses dados estão sendo usados por cientistas do Univesity College London e da Universidade de East Anglia para compreender como as capacidades de navegação espacial variam ao redor do mundo e durante o período de vida.
Esse tipo de conhecimento é crucial para desenvolver uma compreensão mais profunda de como essas habilidades começam a diminuir e dar errado no caso de doenças degenerativas como a de Alzheimer. Seis meses depois do lançamento, o game havia sido baixado por quase 4 milhões de pessoas. Espera-se que no futuro dados do jogo ajudem a informar novas abordagens no diagnóstico e no tratamento da demência.